Há uma pergunta, feita vez por outra, que merece ser respondida aqui: “Tivemos um avivamento na década de 1960, ou não?”. Antes de tudo, temos a considerar que cada avivamento registrado na história teve características próprias, assim diferindo uns dos outros. Por exemplo: o avivamento da missão batista na China caracterizou-se por uma onda de confissões de pecados, que as pessoas voluntariamente iam à frente fazer. Isso causou uma verdadeira revolução na missão batista, fato que levou muitos ao quebrantamento. Já o avivamento no País de Gales levou o povo a uma consagração profunda a Deus, a um grande enlevo espiritual, de modo a passar horas no templo, todos em silêncio – ouvia-se apenas os murmúrios dos lábios e o soluçar das lágrimas de alguns, até que alguém se sentisse impelido e fosse à frente falar.
O avivamento dos moravianos caracterizou-se por um intenso período de oração, que durou cem anos, e por um ímpeto missionário que os levou aos povos mais difíceis de se evangelizar. Depois disso, veio o avivamento de Finney, que redundou numa abundante colheita de almas, perto de um milhão de pessoas. Assim, cada avivamento teve uma finalidade, por isso podemos afirmar que a Renovação Espiritual teve também o seu propósito. Podemos afirmar, então, que houve de fato um avivamento no Brasil a partir da década de 1960.
A Reforma do século XVI girou em torno da Palavra de Deus, que ocupou o seu devido lugar, a sua autoridade em relação ao papa e ao Concílio, como única regra de fé e prática acima de qualquer outra autoridade. Foi o avivamento da Palavra, pois esta se havia perdido no fundo dos conventos, encapuzada por uma “língua morta”, o latim.
Nos fins do século XIX e princípio do século XX, surgiu o movimento pentecostal, da Rua Azusa, nos Estados Unidos, que abalou o mundo evangélico, cuja ênfase foi a busca do Espírito Santo como fator decisivo e imprescindível para o crescimento da igreja e edificação dos crentes. Admitem alguns autores, dentre eles Kennedy Taylor, no livro Teologia do Espírito Santo, que esse movimento teve origem com Charles Finney, que foi teólogo e advogado, homem de cultura sólida e, ao mesmo tempo, um dos mais cheios do Espírito Santo a passar pela terra depois dos apóstolos.
Era uma lacuna que precisava ser preenchida, pois com a Reforma começou a restauração da doutrina evangélica: salvação pela graça, a exclusividade de Cristo, o culto em Espírito e em verdade com a ausência de ídolos, o livre exame das Escrituras, a Bíblia como única regra de fé e prática, mas faltava o outro componente: a doutrina do Espírito Santo. A Bíblia apresenta, numa mensagem clara, que a mesma ênfase dada à Palavra tem de ser dada também ao Espírito, porque eles se completam e são interdependentes na consecução da obra de Deus na terra. Se a Palavra é a espada, o espadachim é o Espírito, nenhum dos dois luta sozinho. Eles dependem um do outro e agem em conjunto, harmoniosamente.
No Brasil, o movimento pentecostal começou numa igreja batista em Belém do Pará, trazido por dois missionários suecos, o qual culminou com a separação dos dois e com a fundação da Assembleia de Deus que rapidamente se expandiu pelo país. Como não poderia deixar de ser, houve grande animosidade entre os dois grupos: os pentecostais acusavam os batistas de serem frios, incrédulos e carnais e de não terem o Espírito Santo; os batistas, por sua vez, acusavam os assembleianos de fanatismo e ignorância e de invocar espíritos numa forma de espiritismo velado.
Criou-se, pois, um fosso entre os dois grupos, tão acentuado que impedia qualquer aproximação. Cada um servia Deus ao seu modo, e cada um se aferrava às suas doutrinas sistematicamente.
Os tradicionais achavam que para evangelizar bastava a Palavra (conhecimento, estudo profundo e disseminação da Palavra), que não era necessária nenhuma ênfase ao Espírito Santo, porque este já estava com a Igreja, Os pentecostais, por sua vez, criam que o mais importante era buscar o poder do Espírito Santo, que este os levaria a um conhecimento da Palavra sem grandes esforços e dispensaria de qualquer preparo teológico quem quisesse se tornar pregador: o Espírito Santo, com os seus dons, supriria qualquer lacuna de conhecimento. Os pentecostais desenvolveram uma teologia empírica, enquanto os batistas tradicionais apegaram-se a uma teologia racional. Assim caminhavam os dois grupos, bem distantes um do outro. Estavam achando que já tinham tudo, que eram donos da verdade e nenhuma contribuição tinham para dar ou receber do outro grupo. Radicalizaram as posições, e cada grupo se fechou em si mesmo.
Deus estava contemplando tudo isso, e não poderia ficar indiferente a essa situação. Passadas algumas décadas, homens sensatos de um e do outro grupo começaram a perceber, tanto lá como cá, que era impossível tanta prosperidade, transformação de vidas, geração de caráter cristão em ambos os lados sem uma atuação do Espírito Santo e da Palavra. Também começaram a notar que, tanto num grupo quanto no outro, os problemas, os escândalos e as fraquezas ocorriam com frequência e que ninguém era melhor do que ninguém. Foi quando Deus começou a derramar o seu Espírito sobre todos os grupos evangélicos e a conferir-lhes experiências inusitadas e dons espirituais, sem que tais pessoas buscassem ou pedissem, até mesmo sobre pessoas que nunca tiveram contatos ou influência pentecostal. E foi assim que surgiu o movimento de renovação espiritual.
No seio das igrejas tradicionais do Brasil, bem como no, Estados Unidos e em outros países, os movimentos carismáticos derrubaram barreiras e removeram preconceitos. Isso resultou numa visão nova do Reino de Deus e do Corpo de Cristo, pois nenhuma doutrina bíblica é propriedade particular de qualquer grupo, e nenhuma experiência está restrita a determinadas pessoas. O Espírito Santo não é propriedade de ninguém, nenhum pastor tem a posse das ovelhas do nosso Senhor Jesus Cristo e os dons do Espírito são dados a cada um conforme ele quer.
A renovação espiritual surgiu para estabelecer essa ponte entre pentecostais e tradicionais, dinamizar igrejas e pastores e despertar muitas vidas, de modo a ampliar a obra de Deus na terra.
Quando os tradicionais, por exemplo, viram alguns dos seus mais importantes líderes serem batizados com o Espírito Santo, perceberam que a obra do Espírito estava acontecendo e não era uma explosão de meras emoções: havia algo mais sério e profundo.
Entre os batistas, um homem como o pastor Achilles Barbosa, ex-padre que fora missionário em Portugal, foi batizado com o Espírito Santo. O pastor Enéas Tognini, que chegou a ser vice-presidente da Convenção Batista Brasileira, escritor da revista de escola dominical, durante dez anos diretor da Faculdade Teológica Batista de São Paulo, homem de muito conceito na denominação e fora dela, foi batizado com o Espírito Santo. O pastor Elias Brito Sobrinho, batista de longos anos e tradição, ortodoxo de vida ilibada, pastor e fundador da Primeira Igreja Batista de Brasília, aderiu a essa obra. Assim também o reverendo Palmírio Andrade, homem culto e respeitado, com uma vida de retidão e de comunhão com Deus dentro da Igreja Presbiteriana Independente; Ageo Silva, de São Paulo, pastor atual da Igreja Evangélica de Vila Iara e ex-vice presidente do Bradesco; pastor Teodoro, orador consagrado da Igreja Metodista do Brasil; Dr. Acyoli Brito, presbiteriano, fundador da Igreja Maranata; Dr. Antônio Barbosa Lima, do Rio de Janeiro, de conceito incontestável no meio evangélico e tantos outros.
Não havia mais dúvida de que o Espírito Santo batizava não só pessoas simples, “leigas” e “psiquicamente” desequilibradas, mas que o batismo com o Espírito Santo e dons espirituais eram coisa séria. Por outro lado, os pentecostais também viram que pessoas cultas e preparadas eram agraciadas por Deus, principalmente quando viram Deus derramar o seu Espírito nos seminários sobre estudantes de teologia e professores.
Naquele início, fui convidado pelo Seminário Presbiteriano Fundamentalista para ser paraninfo dos formandos daquele ano. Quando acabei de falar, um moço da Igreja Pentecostal aproximou-se de mim e pediu-me para ler o discurso que acabara de pronunciar. Ele disse: “Eu não sabia que renovado, cheio do Espírito, precisava escrever sua mensagem, já que os pastores se consideram profetas. Nunca ouvi profecia escrita”. Então respondi: “Meu filho, nesse caso você terá que pegar a sua Bíblia e rasgar as tantas profecias escritas que existem lá”.
Em outra ocasião, fui convidado para assistir às comemorações do cinquentenário da fundação da Assembleia de Deus no Recife. O pastor-presidente tomou a palavra e, falando sobre o poder de Deus, disse que, enquanto os reverendos iam para o seminário se preparar e sair com um diploma, os pastores da Assembleia de Deus estavam ganhando almas pelo poder do Espírito. E concluiu: “Enquanto eles têm o diploma, nós temos Poder”.
Felizmente, essa mentalidade aqui no Brasil está mudando, graças à renovação espiritual. Hoje, a Assembleia de Deus não só dispõe de bons seminários, como de bons teólogos, e de conceituados escritores, como o doutor Antônio Gilberto, Samuel Câmara e tantos outros. Parabéns aos homens líderes dessa grande denominação, que tiveram a humildade de reconhecer que precisavam mudar.
Talvez ainda haja grupos lá fora que mantenham aquela mentalidade. Quando estive em Palermo, na Itália, há uns vinte anos, fui convidado a pregar numa igreja pentecostal muito grande, em relação às igrejas de outras cidades, com cerca de oitocentos membros. No primeiro dia, levei comigo um pequeno esboço sobre adoração. No dia seguinte, antes de subir ao púlpito, um velho obreiro de cabelos brancos chamou-me em seu gabinete para dizer que o povo estava estranhando eu falar com um esboço em cima do púlpito. No momento, fiquei um tanto chocado, pois não esperava que tal mentalidade perdurasse no meio dos pentecostais, mas logo compreendi as limitações daquele grupo tão vibrante, amável e entusiasta.
A renovação espiritual, portanto, veio para abrir os olhos de muita gente, quanto à obra do Espírito e sua atuação entre o povo de Deus.
Foi em Manila, nas Filipinas, em 1989, que ouvi do secretário executivo da Convenção Batista Brasileira uma palavra que muito me alegrou. Tínhamos acabado de almoçar e estávamos batendo um papo no saguão do hotel, todos da caravana do Brasil. Ali estavam batistas, presbiterianos e assembleianos numa conversa informal e muito descontraída, quando um dos pastores batistas virou para o presidente da Convenção Batista Brasileira e, em tom de brincadeira, disse: “Fulano, você não quer ser reeleito? Então procure trazer de volta os renovados: E virando-se para mim, perguntou: “Rosivaldo, por que vocês não voltam para a Convenção Brasileira?”. Então eu respondi: “Por que nunca saímos. Fomos expulsos!” E todos riram.
Após essa conversa, fui procurado pelo secretário da Junta Executiva da Convenção Batista Brasileira para uma conversa no refeitório, que estava vazio. Ele então me falou, não mais em tom de brincadeira, porém revestido da sua autoridade de secretário executivo: “Rosivaldo, por que estamos separados, se na Convenção Batista Brasileira já existem igrejas renovadas, tantas quantas na de vocês, e se na Convenção Batista Nacional existem também muitas igrejas que são tão tradicionais quanto as nossas? Não existe mais motivo para essa separação”.
A conversa prolongou-se por algum tempo, e saí dali com aquela pergunta na mente. Pude sentir em tudo isso que a renovação veio para ficar e para mudar e que, depois de tudo, as igrejas não seriam mais as mesmas, nem os seminários, nem os pastores, porque em toda parte existem servos de Deus que, independentemente da denominação e da doutrina que confessam, estão tendo profundas experiências com o Espírito Santo.
Portanto, a RENOVAÇÃO ESPIRITUAL é Obra santa. Ninguém detém!